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“Associação tenta limitar taxas de conveniência”


194902_1_lei_3625-241122MARCO QUINTANA/JC

Ricardo Silva, da Adecon-RS, acredita que a cobrança é desproporcional aos serviços ofertados

A venda de ingressos on-line para shows e espetáculos artísticos tem facilitado a vida daqueles que não querem ou não dispõem de tempo para passar horas em uma fila para garantir sua entrada. Porém, essa facilidade veio acompanhada de algo que virou um transtorno para os consumidores: a chamada taxa de conveniência. Trata-se de um valor, geralmente de 20%, cobrado sobre o que é pago pelo ingresso. Muitas vezes, essa cobrança se dá até mesmo em pontos de venda físicos. Ou seja, nesses casos, a conveniência é zero.

Uma série de ações coletivas contra empresas do ramo do entretenimento está tentando modificar a maneira como o procedimento é feito em eventos em todo o território nacional. O órgão responsável pelo ajuizamento é a Associação de Defesa dos Consumidores do Rio Grande do Sul (Adecon-RS).

“Chamamos de taxa de ‘inconveniência’, porque ela é mais um infortúnio para o público consumidor do espetáculo do que uma facilidade. Na verdade, ela não dá absoluta vantagem a quem efetuar a compra via internet. Não tem desconto, não tem isenção de fila no dia do show. É um disfarce”, critica o advogado Ricardo de Oliveira Silva Filho, que atua em nome da Adecon.

Silva destaca que as empresas alegam estar oferecendo uma facilidade ao consumidor por disponibilizarem os ingressos on-line, poupando-o das imensas filas nas bilheterias. Porém, lembra que essa compra não garante nenhuma comodidade efetiva. “Imagine o show de uma banda em que custe, digamos, R$ 350,00 a pista premium. Para duas pessoas, já são R$ 700,00. Acrescendo 20% para cada ingresso, seriam mais R$ 140,00, simplesmente pelo fato de se ter feito a compra via internet. E se a pessoa quiser receber em casa, ainda tem que pagar uma taxa de entrega. Cadê a conveniência?”, questiona.

O advogado observa que algumas empresas não disponibilizam sequer um local de venda físico na cidade em que será realizada a apresentação. “Algumas delas só têm postos de venda em São Paulo e Rio de Janeiro. Daí, o consumidor só tem duas opções: ou viaja para outra cidade, o que não se justificaria, ou paga a taxa. O local do espetáculo tem que ter um ponto físico sem exigência da cobrança.”

Três das ações já têm sentenças de procedência parcial dos pedidos de proibição da forma como vêm atuando as empresas. As rés são Ingresso Rápido, Livepass e Tickets 4 Fun – todas já recorreram, sendo que a primeira obteve efeito suspensivo. Estão em andamento demandas semelhantes contra Ingresso.Com, Showcard e Blueticket.

Os processos tramitam na 15ª Vara Cível de Porto Alegre. O juiz Roberto José Ludwig, que julgou as ações envolvendo a Livepass e a Tickets 4 Fun, determinou que as rés deixem de cobrar a taxa sem “vantagem adicional efetiva”. “Se há uma conveniência em obter o ingresso, antecipadamente e de modo seguro, por meio virtual, sem deslocamento físico, isso não significa que, sob tal pretexto, a ré transfira ao consumidor, de fato e sem informações adequadas, importante margem de seus custos que sequer possuem relação com aquela vantagem”, argumenta.

Se condenadas, as empresas, além de arcar com danos morais coletivos e materiais, terão de divulgar a sentença em jornais de grande circulação. As indenizações, retroativas aos últimos cinco anos, seriam pagas mediante a apresentação de ingresso ou e-mail comprovando a cobrança.

Procurada pelo Jornal da Lei, a Tickets 4 Fun preferiu não se manifestar. Luiz Armando Oliveira, proprietário da My Ticket, responsável pela comercialização das entradas da Ingresso Rápido em Porto Alegre, ressaltou que a empresa recorreu da ação e que “há pontos de venda em locais de fácil acesso na cidade, além da opção virtual”. Já a Livepass não retornou os contatos até o fechamento desta edição, mas a venda de ingressos na Capital também é feita via My Ticket.

Rio e Santa Catarina já têm leis sobre o tema

O advogado Ricardo de Oliveira Silva Filho destaca que, apesar de o tema ser relativamente novo, já há legislações estaduais sobre a taxa de conveniência. “O Rio Grande do Sul está atrasado em relação a Rio de Janeiro e Santa Catarina. A lei do Rio é de 2011, e a de Santa Catarina, de 2013, é praticamente uma cópia da primeira”, diz.

Segundo o representante da Adecon-RS, em ambos os casos, a taxa não é vedada, mas limitada, e não há diferença de preço em se tratando de dois produtos oferecidos pela mesma empresa, pois “a natureza do serviço é a mesma”. “A cobrança é por operação realizada. Se o consumidor adquirir três ou quatro ingressos, pagará uma taxa sobre a compra, não sobre o número de ingressos, e ela não pode passar de 10%”, afirma.

Silva ressalta que a Adecon não quer “banir” as taxas de conveniência, mas torná-las razoáveis, coerentes com o serviço oferecido. “É o início de uma legislação pró-consumidor que está surtindo efeito em outros estados. Infelizmente, estamos atrasados, mas é preciso introduzir essa discussão no Judiciário, talvez assim se chegue a algum resultado. Seria fundamental que o Legislativo abraçasse essa causa”, sugere.

O que diz o Procon

Diretora do Procon-RS, a advogada Flávia do Canto Pereira ressalta que a associação é contrária à cobrança de taxas de conveniência da maneira como ela é realizada hoje. “Compra-se quatro ingressos e cobra-se, digamos 20% de cada um, sendo que a conveniência é única”, compara. Flávia ressalta que o “boom de reclamações veio em 2012, por ocasião do show da cantora Madonna em Porto Alegre – na época, a advogada dirigia o Procon da Capital. “Tivemos muitas reclamações quando essa taxa começou a ser cobrada, mas não recebemos tanto agora, porque a população já tem conhecimento, se tornou algo comum. Parece ser uma batalha perdida, mas a gente é contra, sempre questionou isso. Estamos de mãos atadas enquanto continuar essa pendência judicial.”

 

Fonte: Daniel Sanes | http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=194902


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